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Há muitos tipos de tradutores. Há muitos tipos de escritores. Existem pessoas que fazem da tradução a sua maneira de escrever. Para estas, traduzir é uma maneira legítima de fazer literatura, pois concebem a tradução como algo que contém a escrita em si. Entre os tradutoes literários brasileiros que se debruçam sobre a Antiguidade clássica, João Angelo Oliva Neto destaca-se por apresentar esse tipo de concepção da prática tradutória. Em desacordo com o ideário que subvaloriza a tradução perante outros empreendimentos de um literato, sua trajetória demonstra que traduzindo se pode alcançar um nível de excelência na composição literária.
Oliva Neto iniciou-se no estudo de letras em 1978, quando ingressou no bacharelado de inglês e português, pela USP. Quatro anos após, assim que concluíra esse curso, começou o de latim e grego. Ao final de seu segundo bacharelado, motivado pela grande quantidade de textos latinos em prosa e verso sem tradução em português, lançou-se ao ofício da tradução. Ainda na USP, obteve os títulos de mestre e doutor. Junto à sua dissertação de mestrado, apresentou a tradução de toda a obra poética de Catulo, que intitulou O livro de Catulo. Durante o doutorado, ocupou-se com a tradução de um conjunto de poemas anônimos gregos e latinos, cuja figura central é Priapo, deus fálico, protetor da fecundidade e da fertilidade. Estas duas traduções vieram a ser publicadas e são reconhecidas como seus principais trabalhos. Em 1996, O livro de Catulo recebeu o prêmio de melhor tradução, conferido pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte).
A dedicação de João Angelo Oliva Neto à tradução de literatura clássica grega e latina aparentemente deve-se a duas grandes afeições que possui. A primeira - fácil de se inferir - é por essa literatura, inerente ao chamado período clássico. A segunda é pela língua portuguesa e toda a sua literatura. Pelo rigor que se observa em suas traduções, Oliva Neto concebe a transposição da literatura da Antiguidade clássica para a língua portuguesa como um exercício de grande valor artístico. Para ele a literatura traduzida deve ter seu lugar na literatura de uma língua. Sua prática é fundamentada em critérios que transparecem no próprio texto traduzido. Em paratextos às traduções e em artigos publicados paralelamente, Oliva Neto declara preferência por uma tradução que explicite seus critérios teóricos. Isto é, a tradução deve pressupor e esclarecer os fins que pretende atingir e, portanto, o público que pretende alcançar. Na poesia, ele se preocupa com a métrica original e demais características formais, como as figuras de estilo.
Atualmente, é professor da graduação na área de Língua e Literatura Latina da Faculdade Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, onde atua desde 1989. Nessa mesma faculdade, também atua no programa de Pós-graduação em Letras Clássicas. Como tradutor, Oliva Neto almeja colaborar para uma história da tradução poética no Brasil ou ao menos para uma história da tradução de textos clássicos no Brasil. Entre seus projetos está o de traduzir os poemas de Calímaco de Cirene, um poeta grego do século III a.C., por quem nutre grande admiração.
Verbete publicado em 28 de September de 2005 por:
Luiz Henrique Milani Queriquelli
Mauri Furlan
Fragmento de O livro de Catulo, de Catulo. Tradução de João Angelo Oliva Neto:
Si linguam clauso tenes in ore, fructus proicies amoris amnes; uerbosa gaudet Venus loquilla. Uel si uis, licet obseres palatum. Dum nostri sis particeps amoris. |
Se na boca fechada tens a língua, todos os frutos perderás do amor. Vênus se alegra com verbosa fala. Mas se preferes, cala tua lábia, enquanto és cúmplice de meu amor. |
[...] |
[...] |
Huc est mens deducta tua, mea Lesbia, culpa, atque ita se officio perdidit ipsa suo, ut iam nec bene uelle queat tibi, si optuma fias, nec desistere amare, omnia si facias. |
Tanto errou pensamento por tua culpa, minha Lésbia, por seu fervor tanto perdeu-se, que te querer não pode, se fores seu bem, nem deixar de amar, se todo seu mal. |
CATULO. O livro de Catulo. Tradução, introdução e notas de João Angelo Oliva Neto. São Paulo, 1996. p. 104 e 147. |
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